Biosofia nº 5

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Artigo destaque

ENTRE O CÉU E A TERRA
À PROCURA DO GATO DE SCHRÖDINGER
(SOBRE O VÁCUO E A REALIDADE)

A boa compreensão das comparações – explícitas ou implícitas – entre os conceitos das chamadas ciências experimentais e os da sabedoria oculta (ou ciência do espírito) depende de alguns dos princípios gerais desta última ficarem claramente definidos. É esse objectivo que nos propomos atingir neste artigo (quebrando, de algum modo, mas a título excepcional, a bilateralidade caracterizadora desta Secção da “Biosofia” – cfr. o onº 3)

Para o efeito, comentaremos algumas passagens de um sugestivo livro – tanto no título, como no conteúdo: “À Procura do Gato de Schrödinger”. Escrito em 1984 por John Gribbin, doutor em Astrofísica pela Universidade de Cambridge, continua a ser considerado plenamente actual em todos os aspectos fundamentais e a constituir uma excelente apresentação dos paradigmas e dos questionamentos da Física Quântica. Tais passagens e comentários permitem pôr em relevo os diferentes juízos ontológicos, os diferentes conceitos de realidade, os diferentes campos e métodos de investigação das ciências “oficiais” e da ciência esotérica.

Salientamos, porém, que essa diferença não é absoluta: a perspectiva esotérica não “despreza” as metodologias e as áreas de investigação das ciências experimentais; simplesmente, considera-as limitadas, cingidas a um nível epidérmico, e desconhecendo todos os outros. As perspectivas científicas comuns, mesmo quando julgam ter acedido às causas explicativas, não percorreram mais do que uma pequena parte do caminho, permanecendo aquém das verdadeiras raízes dos fenómenos.

Essa incapacidade é amortecida por um nunca acabar de definições terminológicas (de significantes, não de significados), que dá a quem nelas se envolve uma confortável mas ilusória sensação de segurança e de conhecimento sólido – chegando a ponto de cegar, de fazer crer que essa terminologia são os próprios conceitos ou realidades e não meras coisas instrumentais. Pior ainda: fazendo supor que a sua actual terminologia é a “medida universal de todas as coisas” (e que são ignorantes os que recorrem a uma outra terminologia, por sinal muitíssimo mais antiga – e, em rigor, tantas vezes usurpada e mal compreendida por quem chegou depois, ou seja, a ciência pós Francis Bacon) e volvendo-se inaptos para, em qualquer outra formulação, distinguir os acessórios termos formais (que interpretam à sua maneira) dos conceitos neles involucrados. Essa postura obstaculiza a necessária abertura mental.

A verdade é que, na hora de dizer o que é isto ou aquilo, a ciência experimental, malgrado os seus méritos (que sempre salvaguardamos), e depois de dissolvido o turbilhão terminológico, não sabe responder, limitando-se a aludir a algumas das suas expressões ou dos seus efeitos (mesmo que estes sejam causa – secundária – de outros efeitos ainda mais próximos de nós) e a um círculo fechado de redundâncias. É algo assim como se perguntássemos o que é o Homem e obtivéssemos como resposta: “O Homem é um conjunto de átomos que manifesta humanidade, isto é, propriedades humanas, que são características que todos os homens expressam”. Parece que estamos a brincar? Vejam-se as respostas às perguntas sobre realidades essenciais e confira-se se não são aproximadamente deste género. Por isso, sustentamos que os cientistas de hoje não sabem dizer o que é, realmente, “vida” ou “espaço” mais do que os sábios gregos de há 2.500 anos ou os Rishis hindus de idades ainda muito mais arcaicas – a esse nível essencial, de facto, estão-lhes muito aquém, ainda que tenham reunido mais dados experimentais do mundo físico.

Pelo contrário, a ciência oculta sabe dizer o que as coisas são e explica a acção das leis regentes de modo muito mais profundo e abarcante. Os seus cultores, quando esclarecidos, são inclusivamente capazes de sair da sua própria e multimilenar terminologia, tão ou mais extensa e elaborada (e seguramente mais antiga) do que a das ciências oficiais mas que sabem manter no nível (apenas) instrumental que lhe é próprio. A única dificuldade está ao deparar-se com a falta de adaptabilidade de quem, contrariamente a essa postura, julga que os seus padrões e a sua terminologia são um valor absoluto, e se torna incapaz de pensar ou compreender fora dessa prisão. Os que, no campo da ciência, têm outra maleabilidade e outra capacidade de abstracção, abrem-se para mais amplas perspectivas (e permitem os grandes avanços da ciência, por pensamento abstracto e intuição, só mais tarde objecto de confirmação experimental).

Vamos, então, ao supracitado livro. A págs. 137 da edição portuguesa, pode ler-se:
“(…) Tudo se passa como se o electrão estivesse rodeado por uma nuvem de fotões ‘virtuais’ que, com um pequeno toque (um pouco de energia) do exterior, se escapam, tornando-se reais. Num átomo excitado, a transição do estado de maior energia é feita por um electrão que transmite esse excesso de energia a um dos seus fotões virtuais, que abandona imediatamente o átomo, tornando-se real.”

Na realidade, se se não admitir que um fotão possa ter uma contraparte “anímica” (substrato da sua natureza mais aparente, que é a única detectada pela Física) num mundo de existência mais interna mas concomitante com este, seria absolutamente paradoxal o seu surgimento (a partir do nada!, como julga a ciência académica). As estratificações da vida manifestada são inumeráveis, da mesma forma que existem plurigraduações na densidade da matéria química.

A ciência oficial fica perplexa perante a duplicidade onda/corpúsculo dos quanta. Essa perplexidade advém, naturalmente, de não considerar outros planos de percepção e de existência da substância-energia universal, incluindo os de formidável subtileza e grande predominância do pólo espiritual sobre o pólo material (estando os dois pólos, contudo, sempre presentes); de ignorar que a consciência não é um simples produto da forma e, sim, que é predominantemente o contrário que é verdadeiro (todos os pequenos e grandes cosmos, incluindo o ser humano, se produzem de “cima para baixo”, de “dentro para fora”, do íntimo para o exterior, dos níveis potenciais para os de manifestação externa a que, pouco reflectidamente, se chamam “reais”); de não sair de uma posição epistemológica de quase realismo ingénuo.

As “partículas virtuais” são totalmente reais para a percepção possível num nível vibratório da substância mais elevado do que os habitualmente considerados e admitidos pela ciência oficial (nesse nível, mais causal, o que aí existe é compa-rativamente mais real do que aquilo que se manifesta no plano, inferior, dos meros efeitos). Esse nível – e todos os outros não ponderados pela ciência oficial – não deixa de intercomunicar com os níveis de maior materialidade, considerados (mal) como os únicos existentes ou reais.

É por isso que a energia referida se comporta como onda (ou nuvem de homogeneidade) nos níveis mais subtis e, pelo menos, mais próximos da causalidade (onde é comparativamente mais livre e partícipe de uma unidade radical a todas as formas de manifestação deste plano dito “de objectividade”) e, por vezes, se assume como partícula quando é interagida ou “violentada” na sua natureza essencial (ou contraparte superior), ao ser fixada, na sua própria vibração, por um agente externo.

Essa fixação ou atenção direccionada age como compressão ou contenção da expansão vibracional (ou pulsação), o que origina como que uma condensação e consequente precipitação num plano ou escala de inferior frequência vibratória. Degradando-a, momentaneamente – enquanto dura a nossa observação interactiva –, corporifica-a e particulariza-a. Mal a nossa atenção dela se abstrai, fica livre e retoma a sua natureza mais original de nuvem de homogeneidade.

A questão, intrigante para a ciência, dos denominados saltos quânticos só pode ser entendida à luz destes arrebatamentos “intermitentes” (próprios da temporalidade deste plano de consciência) por acção da nossa fixação na natureza essencial dessas “entidades”.

Estas considerações, que aqui se deixam muito sucintamente, serão desenvolvidos com amplitude em próximo número de “Entre o Céu e a Terra”. Uma coisa nos parece certa: o modelo esotérico certamente não merece menos consideração do que os modelos interpretativos/especulativos vigentes. Partir do pressuposto que só no seio da “comunidade científica” ortodoxa podem sair hipóteses de trabalho válidas, antes de ter ouvido e compreendido outras plataformas de entendimento, é um mero pré-concebido, uma simples CRENÇA (que, na chamada “ciência” se supõe não haver, mas há!).

Na verdade, não são as partículas, não são os fotões que são virtuais; o actual conhecimento científico é que é virtual e fictício, em tantos aspectos, ao não saber ponderar, ao ignorar a maior parte do Universo, com os seus diversos planos de substância. (A existência desta pluralidade de planos é um pressuposto fundamental do Esoterismo – e ninguém pode dizer seriamente que aceita, admite ou rejeita a hipótese esotérica se ignorar ou não compreender esse pressuposto). Por muito que já tenha progredido, a ciência oficial é ainda pouco mais do que uma promessa, que lentamente se aproximará da grande ciência universal, cujas premissas, uma a uma, continuará a ir reconhecendo, mesmo dando-lhes outro nome. Aliás, entendemos que é essa a grande importância do caminho da ciência experimental: comprovar, de “baixo para cima”, i.e., dos níveis de maior materialidade para os mais subtis, os grandes princípios estabelecidos, de modo mais global, pelos grandes Sábios e Instrutores da ciência espiritual.

Na página 141 do mesmo livro, encontramos outra sugestiva afirmação:

“Segundo as melhores teorias de partículas, o vácuo é um meio fértil em partículas virtuais, mesmo quando não há partículas ‘reais’ presentes. E isto não é consequência de uma manipulação fútil das equações, pois a explicação das colisões entre partículas obriga a considerar estas flutuações do vácuo.”

Tomemos a definição de vácuo contida em qualquer dicionário: vazio, lugar onde não existe nada, ausência de qualquer coisa. Ora, como pode esse vazio, esse nada, ser um meio – e um meio fértil em partículas (virtuais!) ou no que quer que seja? Como pode nele haver flutuações? É um contra-senso, que tem origem na incapacidade de se aceder efectivamente a esse pretenso vácuo – que, para a ciência oculta, é muito mais importante e real do que o mundo dito real. É aí que tudo se encontra no seu estado mais radical, original e puro, como potencialidade perfeita que depois se vai manifestar no plano da objectividade física (ou melhor, na objectividade da parte do plano físico reconhecida pelos cientistas). Ao manifestar-se, fá-lo no domínio do contigente e do circunstancial, podendo (ou não) existir deste ou daquele modo; a sua potência vai-se degradando, justamente à medida que se distancia do modelo causal. Por isso, afirmamos que é exactamente ao inverso do paradigma da ortodoxia: é esse pretenso vácuo, e o que nele existe, que é mais real.

A ciência materialista parte do pressuposto de que só o mundo físico que (se) pode “ver” é real. É assim uma espécie de realismo-empirismo-físico ingénuo. Com isso, ao reduzir o conceito de realidade à sua (in)capacidade de percepção, cai num estranho objectivismo subjectivista – ou seja, considera unicamente real o que é objectivo para a sua subjectividade. Como podemos restringir o Saber a uma ciência assente nessas premissas, na teimosia dogmática de não admitir outros níveis de substância, de consciência e, portanto, de ciência?

Por ignorar esses níveis em si mesmos, e só verificar, por vezes atónita, os efeitos que de lá promanam, é que a ciência tem que recorrer a ideias como as de que “o vácuo fervilha de actividade” e é um meio onde não existem partículas reais mas onde abundam partículas virtuais!!!

Bem sabemos que se argumentará com o modo como se formou essa noção associada pela ciência ortodoxa (e só por ela!) ao termo “vácuo”, após ter chegado (supostamente) a definir a natureza da luz. Mas qualquer um de nós (incluindo os cientistas ou até a luz), para deslocar-se de um lado para o outro, precisa de um meio ou suporte (que seja de uma frequência vibratória imponderada ou indetectada pela ciência, é outra coisa!) por onde o faça, e precisa de ser real – e não apenas virtual – tanto no ponto de chegada como (parece ser necessário sublinhá-lo) no ponto de origem e em todos os pontos intermédios. Essa deslocação não se processa por simples fórmula matemática, por mais que se diga que o espaço é (apenas)uma sucessão de pontos matemáticos (para a ciência esotérica, causa a maior perplexidade essa despreocupação com a definição ontológica).

Por conseguinte, voltamos ao mesmo: não se pode ignorar o Éter ou Hilon ou Luz Astral ou Alkaest ou qualquer outro sinónimo, onde estão as coisas “virtuais” antes de se tornarem “reais” (para usar as expressões da ciência oficial) e por onde se deslocam como onda.
Se hoje falarmos em Éter, os técnicos da ciência olham-nos entre a incredulidade, a estupefacção e a ironia, afirmando peremptórios “mas essa é uma hipótese que a ciência desenvolveu no passado e que já abandonou por completo”. Pedimos desculpa, mas não é assim: a ciência apropriou-se do termo éter, cuja autoria é muito mais antiga, multimilenar (de sábios gregos de há mais de dois milénios que, por sua vez, se inspiraram no ainda muitíssimo mais antigo conceito de Akasha do esoterismo oriental), interpretou-o mal e restritivamente – porque há o Éter Superior, o Akasha, ainda assim com os seus vários níveis, e o Éter Inferior, a chamada “Luz Astral”, mas a ciência ficou ainda muito aquém deste último, limitando-o hipoteticamente aos estados sólido, líquido ou gasoso; moldou-o ao sabor das necessidades advenientes das suas lacunas de conhecimento e, por fim, quando já estava irreconhecível, revogou-o. Por isso, os que se assumem como herdeiros dessa Sabedoria Antiga – coisa diferente de antiquada – e Universal (e que, portanto, não estão toldados pelo preconceito de que o Conhecimento e a Ciência estão cingidos a 3 ou 4 séculos de uma particular civilização), têm toda a legitimidade para continuar a falar do Éter (se quiserem evitar o termo sânscrito Akasha ou o equívoco “Luz Astral”, que alguns associariam a corpos siderais e outros, quiçá, a espiritismo). Na justiça das coisas, nem necessitariam de explicar que é diferente da(s) ideia(s) de Éter que a ciência em tempos admitiu. Dão essa explicação, ou tentam mesmo encontrar outro termo, como um esforço para se fazerem entender pelos técnicos da ciência – gentileza que muitos destes últimos dificilmente teriam, por falta de maleabilidade e por excessivo autocentramento (às vezes, quase autista) na sua terminologia, na experimentação de alguns fenómenos particulares e no jogo de especulações construídas a partir de alguns aspectos observados.

De resto, seria bom não ignorar – e muitos ignoram – ou não pretender esconder – e tantos, quer na área do materialismo, quer na área das religiões de estado, sectárias e desvirtuadas (ainda que mostrando alguns tímidos sinais de recuperação) pretendem escondê-lo – que a ciência moderna é funda-mentalmente filha das mesmas forças que geraram a Renascença: o neopitagorismo, o platonismo e o neoplatonismo, o hermetismo, a cabala, a alquimia, o rosicrucianismo, a “síncrese” (como erradamente se lhe chama, por se confundir síncrese e síntese) cristianismo/”paganismo”, o misticismo teosófico. Assim, a ciência moderna herdou, naturalmente, toda uma terminologia antiquíssima, oriunda de perspectivas de conhecimento das quais – por terem sido mal compreendidas – se veio a afastar progressivamente. Conservou parte desses termos conferindo-lhes, porém, um significado cada vez mais distante do original, o que não deixa de ser uma usurpação. O próprio uso da palavra ciência no sentido restritivo que actualmente se lhe dá, tem algo de ilegitimidade. Há séculos e séculos que a palavra existia; o esforço de investigação é muitíssimo mais antigo do que se quer fazer supor; a sabedoria ou conhecimento que está na raiz de “ciência” não começou no século XVI e, quanto ao objecto, tem muito mais vastidão do que aquilo que tem cabido no âmbito das ciências ditas experimentais. Por isso, não há razão para que alguém se escandalize quando escrevemos “ciência oficial”, “ciência ortodoxa”, etc.

A ciência moderna tem como paradigma responder ao “como?”. Ainda que só o tenha feito limitadamente, (mas também de forma progressiva) estaria tudo muito bem se não passasse a mensagem de que o seu âmbito é mais vasto (e que responde, por exemplo, à pergunta “O que é?”), se não fulminasse outros saberes (ciências!) ou se não pretendesse que é a única fonte, o único modo, o único paradigma de conhecimento – mais ainda, que é o próprio conhecimento. É por isso que nos vemos, em legítima defesa, na necessidade de escrever este artigo, com afirmações que podem parecer contundentes mas que se constituem numa tentativa de chamar a atenção para a injustificável arrogância de alguns (não todos, felizmente) dos trabalhadores de uma ciência que, sendo louvável no seu esforço, é também limitada e reducionista.

Parte dos tecno-cientistas tornam-se assim como pessoas que, de tanto observarem de perto uma pequena parte de um elefante (ou seja, apenas uma escassa proporção dos níveis de energia-substância do Universo), acabam por se esquecer de que existe o elefante, e disfarçam esse desconhecimento fundamental descrevendo muitos poros e dando muitos nomes complicados a todas as partículas – “reais” e “virtuais” – da (somente) pequena parte epidérmica analisada. De tanto se fecharem no pensamento concreto, grande parte dos cientistas estão perdidos num mar de abstracções, de coisas virtuais. São uma ilha de concreto rodeada de vácuo e de abstracções por todos os lados. Desconhecem, recusam-se a aceitar que o vácuo está do lado de cá, na sua subjectividade serva de um (pseudo)realismo limitado ao plano físico; o vácuo é, afinal, o seu vazio de conhecimento sobre os níveis mais reais, mais essenciais do universo.

Tudo tem substância, não é uma irrealidade, um vazio, um nada. Tudo, até mesmo uma alma. Ignorando isto, muitos trabalhadores da “ciência oficial” fecham-se num materialismo puro e duro ou criam, em si mesmos e no mundo, uma cisão fatal entre a ciência e a chamada “fé”, o que lhes permite (embora de modo precário e com muitas angústias) compensarem-se afectivamente, dar algum consolo aos gritos desesperados da sua natureza superior, e acreditar em mais vácuos e em mais coisas virtuais – ou seja, que não sabem o que é e que julgam ser desconhecidas de todos os outros. Retome-se a grande tradição universal da existência de (sete) distintos planos de percepção e de existência que se interpenetram12, desde os mais subtis ou espirituais até aos de maior materialidade – o último dos quais, o plano físico -, e teremos a via aberta para dois notáveis resultados: a ciência deixará de ter que falar em vazios férteis e em partículas virtuais; a espiritualidade passará a estar assente em bases científicas, visto que onde há substância, há leis e pode (e deve) haver ciência. Teremos, então, uma ciência espiritualizada, compassiva e eticamente informada; uma religiosidade sólida, compreensível e demonstrável.

Para que assim seja, contudo, é preciso largar as palas de uma especialização excessiva, que nos pode tornar indivíduos tecnicamente muito competentes num campo delimitado mas que nos cega para todas as restantes plataformas de conhecimento – incluindo noções históricas, conhecimentos das diversas ciências experimentais, psicológicas, sociais e humanas, dos grandes pensadores e filósofos, da ciência espiritual legada pelos Mestres “do saber de todos os tempos e lugares”, das diferentes tradições religiosas (e não, apenas, da prevalecente no nosso “quintal”). Quantos técnicos da ciência experimental sabem quem foram e o que disseram o Buda Gautama (não, não era um senhor muito gordo…), Shankârâchâria, Patanjali, Apolónio de Tiana, Ammonio Saccas, Ramânuja? Que noções têm dos sistemas desenvolvidos por Kapila, Plotino, Jâmblico, Avicena, Leibniz, Spinoza ou Fichte? Já ouviram sequer falar da vedanta advaitista, do sufismo, dos Upanishads, do Evangelho segundo Tomé, do Pistis Sophia, do Tao Te King, do Corpus Hermeticum?

Vejamos, enfim, outra passagem de “À Procura do Gato de Schrödinger”:

“Como podem desaparecer todas essas realidades sobrepostas, nenhuma menos real do que a remanescente? A melhor resposta é a de que nenhuma realidade se esvai, de que o gato de Schrödinger está realmente morto e vivo ao mesmo tempo, mas em dois mundos diferentes. A interpretação de Copenhaga (e todas as suas consequências práticas) está completamente contida numa visão mais completa da realidade, a interpretação dos mundos múltiplos” (pág. 160)
Et voilá, eis que acaba por se admitir uma “visão mais completa da realidade” (melhor seria dizer: “a visão de uma realidade mais completa”) e os “mundos múltiplos”. Entretanto, mesmo estas concepções mais lúcidas e ousadas (mas que, claro, escandalizam a alguns) permanecem confusas e insuficientemente fundadas – e por isso, podem até vir a ser (provisoriamente) abandonadas, como o Éter, para mais tarde reaparecem sob outro nome. Acima de tudo, falta-lhes uma noção de hierarquia, princípio presente em todo o Cosmos, embora concomitantemente com a unidade de toda a vida – outro antigo aforismo oculto que a ciência ortodoxa vai tacteando progressivamente -, sendo que esses dois princípios se enlaçam de acordo com a seguinte lei: “todos os seres existem num ser maior”.

Quando escrevemos todos os seres, isso inclui tanto um átomo, como um homem, como um planeta, como um deus.

Deste modo, os planos de ser ou mundos da substância universal são múltiplos mas existem hierarquicamente, distinguindo-se pela maior ou menor frequência vibratória da respectiva energia; pela maior ou menor elevação e abarcância de consciência que neles é possível vivenciar; pela maior intimidade (i.e. proximidade do centro ou raiz causal) ou externalidade. O plano astral (não tem a ver com astros, quer da astronomia quer da astrologia) é hierarquicamente superior ao físico; o mental, é hierarquicamente superior a ambos. Por ordem crescente de elevação, subtileza, cristalinidade, temos ainda os planos intuicional, átmico, monádico, divino. Entretanto, como cada um destes planos, por seu turno, se subdivide septenariamente, existe uma hierarquia no próprio mundo físico. Assim, o estado líquido, pela sua maior subtileza ou menor densidade, está hierarquicamente acima do sólido; no próprio septenário físico, há estados que a actual ciência não pondera (e, enquanto não ponderar, continuará a haver muitos “gatos”, sejam procurados ou não); até os elementos químicos da tabela periódica têm uma hierarquia.

Podem os trabalhadores da ciência indutiva não se dispor ao esforço de abertura mental para perceberem realmente esta hipótese; mas não cremos que possam afirmar que é um modelo menos válido do que os vigentes, se o tiverem compreendido a sério. E, na ausência de tal esforço, que não se julguem no direito de colar rótulos de “antiquado” e “anti-científico” – para não referir outros epítetos muito piores – ao que desconhecem realmente o que seja, isto é, a sabedoria esotérica; que tão pouco estranhem uma reacção mais forte (como esta) da parte de quem conhece um sistema demasiado extenso, profundo, coerente, universal e fundamentado, em muitos níveis, para aceitar que essa concepção seja tratada com indiferença ou desdém.

or fim, importa aclarar: apesar dos seus limites actuais, a ciência ortodoxa é muito digna do reconhecimento, por toda a humanidade, em face das conquistas tecnológicas que prodigalizou (incluindo a que permite editar este artigo); do contributo que deu para desvanecer muitos medos, superstições e crendices; dos inúmeros dados experimentais que obteve e facultou (coisa diferente da contestabilidade de vários dos seus pressupostos ou teorias); de ter generalizado (”popularizado”) a noção de rigor científico, de fundamentação, até mesmo de conhecimento. Ninguém de boa fé, e nós muito menos, contestamos o seu lugar na grande batalha do progresso humano – aliás, o advento da ciência moderna constitui um marco notável nesse caminho – ou na grande reunião (ou partilha) de todos os esforços sérios de compreender o Universo e a Vida, com as respectivas leis.

De resto, o cepticismo materialista de parte da chamada “comunidade científica” apresenta uma atenuante significativa: as alternativas mais conhecidas são as construções pueris das Igrejas oficiais ou os (pseudo)esoterismos desvirtuados e irreflectidos que dão espectáculo (infelizmente pelo rídiculo) e, não, a profundíssima ciência esotérica. Assim, muitos pensarão que não vale a pena investigar outros campos – embora essa seja uma atenuante que se vai desvanecendo na presente “aldeia global” (para que a tecnologia propiciada pela ciência também contribui). A dizer a verdade, o chamado cepticismo pode apresentar duas faces – uma, positiva, constitui sã prudência; outra, negativa, funda-se em estreiteza mental. Cultive-se a primeira, alerte-se para a segunda.

Não queremos, portanto, negar a utilidade da ciência experimental. Entretanto, era necessário dizer(-lhe): que se recorde dos seus limites; que se não coloque numa postura de arrogância, porque é muito o que (ainda) ignora; que não olhe desdenhosamente para perspectivas que, no mínimo, tomaram em conta muito mais elementos, idades, culturas e tradições; que se questione bem sobre se não transmite para a “opinião pública” uma noção de infalibilidade, de omnisciência e de exclusividade do conhecimento, a que vai regra geral inerente (quando não é explicitado) um (pre)conceito materialista – abusivo, por constituir somente uma possível interpretação, que está longe de ter provado que é a única ou, sequer, a melhor. É essa suposta exclusividade e esse unilateralismo que não podíamos deixar de contestar.

Isabel Nunes Governo
Vice-Presidente do Centro Lusitano de Unificação Cultural

José Manuel Anacleto
Presidente do Centro Lusitano de Unificação Cultural